Pesquisa mostra como é variável a disseminação do novo coronavírus no Brasil
Em estudo publicado no MedRix (acesse aqui o trabalho na íntegra), um grupo liderado por pesquisadores da Universidade Federal de Pelotas rastreou em 133 cidades brasileiras a presença de anticorpos contra o vírus SARS-CoV-2 em amostras de sangue de mais de 25 mil pessoas por todo o território brasileiro. Os dados foram coletados entre abril e maio de 2020 e as amostras foram analisadas por meio de testes sorológicos. O estudo revelou que 1,4% da população amostrada foi positiva, ou seja, apresentaram anticorpos contra o vírus SARS-CoV-2, causador da COVID-19, indicando que naquele determinado momento havia sete vezes mais pessoas infectadas pelo coronavírus do que o reportado. Portanto, se considerarmos apenas a população que vive nas 133 cidades testadas, as quais representam 25% da população brasileira, estima-se que ocorreram 760 mil casos de contágio e não aproximadamente 104 mil, como reportado oficialmente na época.
O valor de 1,4% também demonstra que o Brasil ainda está longe de atingir a imunidade de rebanho, isto é, de ter um número suficiente de pessoas circulando que apresentem anticorpos para o SARS-CoV-2, causando a redução da circulação do vírus e, consequentemente, diminuindo a taxa de contágio. Para a COVID-19, pesquisadores estimam que é necessário um mínimo de 60-70% de pessoas que apresentem os anticorpos para que a queda na taxa de contágio seja significativa.
Os pesquisadores também observaram que a taxa de pessoas com a presença de anticorpos contra o vírus da COVID-19 apresentou-se significativamente maior entre as pessoas que se declararam pardas ou indígenas, as quais se concentram na região Norte do país. As cidades com maior número de casos e, consequentemente, com maior taxa foram aquelas que margeiam o rio Amazonas. Locais como Castanhal, Belém, Breves,Tefé e Macapá tinham um alto número de pessoas com anticorpos. Em Breves, uma cidade da Ilha de Marajó, cerca de 25% da população amostrada teve resultado positivo para o teste. Enquanto que nas cidades de Tefé e Belém, tiveram cerca de 19 e 15% de testes positivos, respectivamente. Comparando com a cidade de São Paulo, o epicentro da pandemia do país, com 3,3% de casos positivos, esses números são alarmantes. Os pesquisadores descobriram que todas as cidades que fazem parte da trajetória da rede fluvial do Amazonas apresentaram alto índice de resultados positivos para a COVID-19. Isto demonstra que diferentemente de outras regiões do país e do resto do mundo, em que a malha aérea foi o principal meio de disseminação do vírus, na região Norte do país o transporte fluvial foi e ainda está sendo o principal vetor de contaminação da COVID-19. Isso pode ser explicado pela lentidão do transporte fluvial, que ainda apresenta um grande número de passageiros que viajam aglomerados e por longos trajetos.
Essa coleta de dados será repetida pelos pesquisadores a fim de compreender a dinâmica da COVID-19 aqui no Brasil. Esse foi o primeiro estudo em grande escala no Brasil e foi capaz de mostrar como a trajetória de disseminação da COVID-19 é heterogênea, além de indicar que as diretrizes para sua redução devem ser repensadas, e aplicadas de maneira pontual e adequada para cada região do país.